Análise de Caso
O conceito de compliance tem se tornado cada vez mais relevante no ambiente corporativo, especialmente em setores sujeitos a forte regulamentação, como o de comunicação. No contexto empresarial, compliance significa estar em conformidade com leis, normas e regulamentos, garantindo que a organização atue de maneira ética e transparente. No caso das empresas de comunicação, esse conjunto de boas práticas envolve não apenas o cumprimento da legislação, mas também a adoção de políticas internas que assegurem a integridade na produção e disseminação de informações.
Essencial para empresas
O termo compliance deriva do verbo inglês "to comply", que significa "cumprir" ou "obedecer". No ambiente corporativo, refere-se à implementação de um sistema que previna, detecte e corrija desvios éticos e legais, reduzindo riscos para a empresa. Esse conceito ganhou força especialmente após grandes escândalos financeiros e de corrupção, levando à criação de legislações mais rigorosas, como a Lei Anticorrupção Brasileira (Lei nº 12.846/2013) e normas internacionais, como a Lei de Práticas de Corrupção no Exterior (FCPA) dos Estados Unidos.
Para empresas de comunicação, compliance não se limita à conformidade com normas contábeis e trabalhistas, mas se estende a regras específicas do setor, como a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD - Lei nº 13.709/2018), o Código Brasileiro de Autorregulamentação Publicitária e as diretrizes do Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária (Conar).
Implicações legais
As empresas de comunicação lidam diretamente com um dos ativos mais sensíveis da sociedade: a informação. A implementação de um programa de compliance eficaz nesse setor tem diversas implicações, desde a transparência na publicidade até a proteção da liberdade de imprensa e o combate à disseminação de fake news. Entre as principais áreas impactadas estão:
1. Conformidade regulatória e ética na produção de conteúdo
A veiculação de notícias e conteúdos jornalísticos exige compromisso com a verdade e a imparcialidade. Empresas de comunicação devem adotar códigos de conduta que impeçam a divulgação de informações falsas ou tendenciosas, além de treinamentos constantes para jornalistas e colaboradores. A responsabilidade editorial também envolve a correta atribuição de fontes e o respeito aos direitos autorais.
Além disso, veículos de mídia precisam se adequar à legislação vigente, como a LGPD, que impõe regras rigorosas sobre o uso de dados pessoais. Isso significa que informações de leitores, assinantes e usuários de plataformas digitais devem ser coletadas, armazenadas e tratadas de maneira segura e transparente.
2. Prevenção à corrupção e transparência financeira
A relação entre empresas de comunicação e entes públicos ou privados deve ser pautada pela transparência. O compliance atua na prevenção de práticas como pagamento de propina para obtenção de publicidade oficial, concessões indevidas de licenças e conflitos de interesse entre jornalistas e fontes.
Outro aspecto relevante é a prestação de contas e auditoria interna para evitar fraudes financeiras. O setor de mídia movimenta bilhões de reais anualmente, e sem um controle adequado, pode se tornar alvo de corrupção e lavagem de dinheiro.
3. Compliance publicitário e responsabilidade social
Empresas de comunicação também atuam como intermediárias na veiculação de publicidade, o que exige rigoroso controle sobre o conteúdo dos anúncios. O Conar estabelece diretrizes para evitar propagandas enganosas, abusivas ou que violem direitos do consumidor.
Com a ascensão do marketing digital e da publicidade programática, o compliance precisa garantir que anúncios não sejam direcionados de forma discriminatória ou exploratória, respeitando normas como o Código de Defesa do Consumidor e a LGPD.
Além disso, há uma crescente demanda por responsabilidade social e sustentabilidade nas comunicações corporativas. Empresas que adotam práticas ESG (Environmental, Social and Governance) reforçam sua credibilidade perante o público e investidores.
4. Combate à desinformação e fake news
Com a proliferação das redes sociais e plataformas digitais, empresas de comunicação enfrentam desafios cada vez maiores no combate às fake news. O compliance pode atuar na implementação de filtros editoriais e parcerias com agências de checagem para garantir que as informações divulgadas sejam verificadas e confiáveis.
A legislação brasileira já prevê penalidades para a disseminação intencional de informações falsas, especialmente quando impactam eleições ou a saúde pública. Assim, veículos de mídia que descumprem essas normas podem ser responsabilizados civil e criminalmente.
Comunicação transparente
Para garantir a conformidade com as leis e normas do setor, empresas de comunicação devem estruturar um programa de compliance baseado nos seguintes pilares:
1. Comprometimento da alta direção – O exemplo deve partir dos líderes da organização, que precisam demonstrar compromisso com práticas éticas e conformidade legal.
2. Criação de um código de conduta – Documento que estabeleça diretrizes claras para jornalistas, editores, publicitários e demais colaboradores sobre ética e responsabilidade profissional.
3. Treinamento e capacitação contínua – A equipe deve ser treinada regularmente sobre compliance, incluindo boas práticas de governança, proteção de dados e combate à desinformação.
4. Canais de denúncia e auditoria interna – A empresa deve oferecer meios seguros para que irregularidades sejam reportadas, além de realizar auditorias periódicas para identificar riscos.
5. Monitoramento e atualização constante – O cenário regulatório está em constante mudança, e o compliance precisa se adaptar às novas leis e tendências do setor.
Além da ética
O compliance é um elemento essencial para empresas de comunicação que desejam atuar de maneira ética, transparente e em conformidade com a legislação. Além de mitigar riscos jurídicos e financeiros, um programa de compliance bem estruturado fortalece a credibilidade da empresa e sua relação com o público.
Em um cenário de crescente regulação e desafios como fake news, proteção de dados e transparência publicitária, as empresas do setor precisam investir em boas práticas para garantir sua sustentabilidade e relevância no mercado. O compromisso com a ética e a legalidade não é apenas uma obrigação, mas também um diferencial competitivo em um ambiente onde a confiança do público é um ativo cada vez mais valioso.
Demissão
A demissão por infringir regras éticas e de compliance pode, sim, ser considerada justa causa, mas sua reversão dependerá de diversos fatores, incluindo a proporcionalidade da punição, a existência de provas robustas e o cumprimento dos procedimentos legais na dispensa.
A justa causa está prevista no artigo 482 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e pode ser aplicada quando há falta grave cometida pelo empregado. Muitas violações de compliance se enquadram em motivos de justa causa, como:
- Improbidade administrativa (fraudes, corrupção, desvios de recursos);
- Incontinência de conduta ou mau procedimento (assédios, condutas antiéticas);
- Violação de segredo da empresa (vazamento de dados sigilosos);
- Ato de indisciplina ou insubordinação (descumprimento de normas internas de compliance).
Se a infração for comprovada e estiver prevista no código de conduta da empresa, a demissão por justa causa pode ser válida.
A reversão pode ocorrer se houver falhas no processo disciplinar, como:
- Ausência de provas concretas sobre a infração;
- Desproporcionalidade da penalidade, quando uma falta leve resulta em uma punição extrema;
- Quebra do princípio da imediaticidade, ou seja, se a empresa demora muito para punir o funcionário após tomar conhecimento da infração;
- Descumprimento de normas internas, caso a empresa não siga seu próprio código de conduta para apurar a violação.
Se o empregado provar que foi dispensado injustamente, a Justiça do Trabalho pode reverter a demissão para sem justa causa, garantindo direitos como aviso prévio, FGTS e seguro-desemprego.
Para minimizar o risco de reversão da justa causa, a empresa deve:
- Realizar uma investigação interna adequada, garantindo o direito de defesa do empregado;
- Registrar todas as provas da infração (e-mails, testemunhos, auditorias internas);
- Seguir as diretrizes do compliance e aplicar penalidades proporcionais à gravidade da falta;
- Manter um histórico de advertências, quando aplicável, antes de decidir pela demissão.
Se todos os procedimentos forem seguidos corretamente, a demissão dificilmente será revertida. No entanto, cada caso é analisado individualmente pela Justiça do Trabalho, que pode entender que a punição foi excessiva ou indevida.